FATIMA - & - GIL - F MasterThesis - FINAL
FATIMA - & - GIL - F MasterThesis - FINAL
Agosto, 2012
Maria de Fátima Batista Sancho
Júri
Presidente: Professora Doutora Élia Maria Carvalho Pinheiro Silva Pinto
Professor Adjunto na Escola Superior de Saúde do Alcoitão
Both pregnancy and labor impose morphological and functional adaptations to the
abdominal wall muscles. The rectus abdominal is one of the muscles that undergo
significant changes all over this process. Very little literature about abdominal muscular
changes during pre and postpartum is available. The aim of our study was to analyze the
effect of the abdominal muscles contraction on the intra rectus distance (IRD). Sixteen
postpartum, primiparous women have participated in this study. Images from the
abdominal wall muscles were obtained through an ultrasound system with a 38mm linear
array transducer at 7-13 MHz. The IRD was measured 2cm above middle umbilicus. IRD
measures were taken in a rest position and in three different types of contraction. Our study
results show that IRD was significantly higher in rest condition than in any other of the
contraction conditions. There was no significant difference in IRD between contraction
conditions.
1
A parede abdominal parece ser uma das estruturas mais afectados pelo crescimento do
feto e muito especificamente o músculo recto do abdómen (RA) (Gilleard & Brown, 1996;
Lo et al., 1999). Separando os dois RA encontra-se uma faixa aponevrótica conhecida por
Linea Alba (LA) que se estende desde o apêndice xifóide à sínfise púbica sendo formada
pelo entrecruzamento das fibras aponevróticas dos músculos transversos e oblíquos do
abdómen (Axer et al., 2001).
À medida que o feto cresce as duas bandas dos RA, ligados pela LA, alongam e curvam
acompanhando a expansão da parede abdominal, a LA torna-se mais branda e é a nível do
umbigo que se pode verificar uma maior separação dos dois ventres musculares dos RA
(Boissonnault & Blaschak, 1988; Fast et al., 1990; Gilleard & Brown, 1996). De acordo
com Polden (1975) a DIR pode variar entre 2 a 3 cm em largura e 12 a 15 cm em
comprimento e os 12 a 20 cm em largura envolvendo todo o comprimento dos RA. O
aumento da DIR é muitas vezes referido como diástase ou devaricação dos rectos do
abdómen (DRA), sendo descrita como uma alteração dos músculos da parede abdominal e
da Linea Alba. A DRA pode surgir por volta das 12 semanas de gravidez, altura em que o
feto sai da cavidade pélvica tendo um pico imediatamente após o parto e nas primeiras
semanas pós parto (Boissonnault & Blaschak, 1988; Coldron, Y. et al., 2008).
De acordo com Lih-Jiun Liaw et al. (2011) uma recuperação incompleta da integridade
estrutural da LA pode levar a um défice mecânico resultante na diminuição da capacidade
de produção de força da musculatura abdominal. Neste estudo a largura da LA e da função
abdominal não regressaram a valores normais aos seis meses pós parto, a medida da DIR
estava negativamente correlacionada com a função muscular abdominal e a melhoria da
DIR aos 6 meses estava positivamente correlacionado com uma melhoria da força dos
flexores do tronco (Liaw, L. J. et al., 2011).
Por outro lado Coldron et al. (2008) dizem-nos que um aumento do DIR poderá levar a
uma diminuição da rigidez da parede abdominal e a uma possível desvantagem mecânica.
Estas alterações da resistência interna passiva (stiffness muscular) podem originar
desequilíbrios musculares e consequentemente levar a uma deficiente coordenação dos 3
músculos da parede abdominal pelas suas ligações via aponevroses e LA. De acordo com
os mesmos autores isto trará implicações para um programa de exercícios pós natal razão
pela qual, seria muito importante conseguir identificar os factores que reduzam uma DIR
persistente, aumentem a espessura dos RA e reduzam a largura da LA.
Para além dos efeitos que uma DRA pode trazer a nível da função e coordenação dos
músculos da parede abdominal e da melhoria da força dos flexores do tronco, outros
estudos mostram que devido à sua relação sinérgica, uma diminuição da função muscular
abdominal relacionada com a DRA pode afectar a actuação dos músculos do pavimento
pélvico (Gilleard & Brown, 1996).
Os músculos do pavimento pélvico têm como principais funções 1) suportar os órgãos
que se encontram na cavidade pélvica e 2) contribuir para o encerramento da uretra, vagina
e ânus funcionando como esfíncter externo. A disfunção destes músculos põe em risco
tanto a sua função de suporte como a de manutenção da continência urinária e anal. A
perda da função de suporte dos músculos do pavimento pélvico está pois implicada no
3
diagnóstico de incontinência urinária (DeLancey, 1997; Bo, 2009); incontinência fecal e
prolapso dos órgãos pélvicos (Barber, 2005).
Nos últimos anos têm surgido vários programas que visam fortalecer os músculos
abdominais e mais recentemente programas específicos para o fortalecimento dos
músculos abdominais profundos, no intuito de melhorar a força e o controlo do tronco e
diminuir a incidência de dor lombar. No entanto, a literatura dá-nos informação escassa e
pouco precisa de quais os exercícios mais adequados numa fase após o parto.
Os músculos da parede abdominal oblíquo interno (OI), oblíquo externo (OE),
transverso do abdómen (TrA) e rectos do abdómen (RA) são responsáveis pelo movimento
do tronco, asseguram a estabilidade da coluna (Granata et al., 2000), regulam a pressão
intra-abdominal (Cholewicki et al., 2002) e assistem na respiração.
Ao contrário da maioria dos músculos que encontramos no corpo humano os músculos
da parede abdominal não transmitem a sua força necessariamente através de tendões com
inserção directa na estrutura óssea. Muitas das fibras do OI, OE, e TrA terminam em
aponevroses que se prendem e formam a bainha à volta dos RA, continuando para a linha
média da Linea Alba (LA) e mesmo cruzando-se para o lado oposto onde se fundem com a
bainha contra lateral dos RA. De acordo com Brown (2008) a forma complexa como está
organizado o tecido conjuntivo que suporta as várias ligações aos músculos da parede
abdominal, permite que o mesmo se deforme, conseguindo simultaneamente uma expansão
ou contracção ao longo de múltiplos eixos, a fim de se adaptar às diferentes forças que
actuam ao longo do sistema. As forças laterais produzidas pelos músculos oblíquos e
transverso parecem dominar o efeito da contracção média, da força longitudinal produzida
pelos RA, de tal forma que o tecido conjuntivo que intervêm nestes músculos
(especificamente os tendões transversos dos RA’s e Linea Alba) tem de funcionar para
acomodar e distribuir a força (Brown, 2008).
No nosso estudo seleccionámos dois exercícios usados habitualmente no fortalecimento
dos músculos da parede abdominal: o “abdominal crunch” e o “drawing in” e ainda uma
conjugação dos dois a que chamámos ”drawing in com abdominal crunch”.
O exercício “abdominal crunch” foi incluído com base nos estudos de Axler e Mcgill
(1997) que demonstraram que entre outros 12 exercícios de fortalecimento abdominal
testados, este era aquele que apresentava o maior desafio muscular com a menor
compressão a nível da coluna lombar. Também no estudo de Teyhen et al.l (2008) numa
4
população não grávida, com o objectivo de perceber qual a contribuição dos músculos
profundos do abdómen e do RA, foram caracterizadas as alterações da espessura do TrA e
OI durante exercícios comuns de fortalecimento do tronco. Neste estudo o aumento da
espessura muscular tanto do TrA como do OI durante o “abdominal crunch” estão de
acordo com as recomendações anteriores constituindo um bom exercício para usar como
treino dos músculos abdominais não só pelo seu forte apelo ao trabalho aos mesmos como
também pela baixa sobrecarga na zona lombar.
O outro exercício seleccionado foi o “drawing in abdominal” pois, de acordo com
Teyhen (2005), este exercício tem um efeito de activação preferencial do músculo
transverso do abdómen com alterações mínimas a nível do músculo obliquo interno. Á
semelhança do estudo de Teyhen et al. (2008) este exercício foi ainda executado em
simultâneo com o abdominal crunch, não só pela sua capacidade de facilitação da
co-activação do músculo transverso do abdómen e dos músculos multifidius, ambos
importantes na estabilização do tronco, como pelo seu uso clinico como um pilar
fundamental para os exercícios de estabilização lombar
Na selecção dos exercícios numa fase pós parto, teve-se em consideração a existência de
uma DIR aumentada e de uma musculatura e LA alterada. A necessidade de conjugar este
conhecimento com o que se passa ao nível dos abdominais profundos e do seu papel na
DIR parece-nos fundamental para o estabelecimento de um programa de fortalecimento
dos músculos abdominais.
No ensino dos exercícios seleccionados tivemos em consideração os resultados do
estudo de Teyhen et al. (2008) que estão em concordância com os de Karst & Willet
(2004) ao demonstrarem que a activação dos músculos abdominais profundos pode ser
enfatizada através de um ensino adequado dos exercícios, tal como: pedir para executar o
“abdominal crunch” enquanto mantém o exercício de “drawing in abdominal” o que
parece ter uma importância significativa na activação dos RA (Teyhen et al., 2008). No
exercício de “drawing in abdominal” é pedido ao sujeito que efectue uma contracção
prévia do TrA que no nosso estudo foi ensinada, verificada e dada como feedback ao
sujeito por meio da imagem ultrasónica.
No exercício de “drawing in abdominal” e “drawing in abdominal com abdominal
crunch” solicitou-se a expiração durante o exercício a fim de evitar a manobra de Valsalva,
indesejável por provocar um aumento da pressão intra-abdominal com consequente
aumento da pressão a nível lombar e nos músculos do pavimento pélvico.
5
1.4 Âmbito e Objectivos
O presente trabalho integra-se num estudo mais alargado sobre o efeito da carga
mecânica no sistema músculo-esquelético da mulher durante a gravidez e após o parto,
nomeadamente sobre o efeito do trabalho abdominal na distância inter-rectus do abdómen,
realizado pelo Laboratório de Biomecânica e Morfologia Funcional da Faculdade de
Motricidade Humana (FMH) da Universidade Técnica de Lisboa (UTL) no âmbito de um
projecto financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia em articulação com o
Grupo de Neuromecânica do Movimento Humano, do Centro Interdisciplinar de
Performance Humana (CIPER – FMH/UTL).
O estudo teve como principal objectivo analisar o efeito da contracção dos músculos
abdominais, nomeadamente do transverso do abdómen na distância inter-rectos do
abdómen (DIR) em mulheres no período pós-parto. Antecipou-se como hipótese de
trabalho que a contracção da musculatura abdominal estaria acompanhada da redução da
DIR sendo esse efeito mais acentuado nos exercícios com activação prévia do músculo
transverso do abdómen.
6
2 Metodologia
2.1 Amostra
Tabela 1 - Dados individuais referentes à idade, Índice de Massa Corporal (IMC), aumento
ponderal (Kg) e características da gravidez e parto.
7
Estes dados foram recolhidos pois de acordo com Lo (1999) poderão ser factores de
risco para o aumento da DIR: a idade materna (> 34 anos); o aumento ponderal da mãe,
razão pela qual se foi averiguar qual o IMC no início e no final da gravidez; a
multiparidade; o peso do recém-nascido superior ou igual a 3,7 Kg e o tipo de parto
(vaginal ou cesariana). Todas estas variáveis poderão estar implicadas no aparecimento da
DRA pelo efeito que as mesmas podem ter no estiramento, sobrecarga e stress da parede
abdominal (Boissonnault & Blaschak, 1988; Nahas et al., 2004; van Uchelen et al., 2001).
De acordo com Cândido (2005) o aumento da DIR está associado com a etnicidade
caucasiana.
Considerando que os valores médios esperados de IMC para esta população se situam
entre os 20 e 26 Kg/m2 podemos afirmar que os participantes no estudo tinham um IMC
ideal no início da gravidez. Nestas condições espera-se que o aumento ponderal varie entre
os 11,5 Kg e os 16 Kg, tal como aconteceu na maioria dos participantes, á excepção dos
sujeitos #5 e #14 (Tabela 1) que apresentaram aumentos de 21 Kg e 7 Kg, respectivamente.
Três dos sujeitos (#1, #7 e #15, Tabela 1) apresentaram valores de IMC no início da
gravidez superiores ou iguais a 26 Kg/m2, o que é indicativo de peso acima do desejável.
Também no final da gravidez os participantes do estudo apresentaram valores de IMC
considerados normais para este tipo de população (Cecchetto et al., 2000).
A amostra foi por conveniência tendo sido recrutadas todas as mulheres que.se
encontravam a fazer as sessões pós natais num gabinete privado de fisioterapia e que
voluntariamente se disponibilizaram a participar no estudo. No momento do estudo
nenhuma mulher tinha iniciado qualquer actividade física após o parto. Todas as
participantes foram informadas quanto aos objectivos e procedimentos do estudo
destacando-se as condições de segurança e a possibilidade de abandonar o estudo caso
assim o entendessem. As questões de ética do presente estudo foram apreciadas e
aprovadas pelo Conselho Científico da FMH tendo todas as participantes assinado os
formulários respeitantes ao consentimento.
Os resultados do sujeito #15 (Tabela 1) foram analisados em separado por apresentar
valores de DIR muito acima dos valores médios dos restantes participantes do estudo.
B
A C
9
Tabela 2 – Sequência e descrição dos procedimentos experimentais.
Posição de Repouso/inicial
Sujeito em decúbito dorsal com os
joelhos flectidos a 90º, mãos ao longo do
corpo, apoiadas na mesa e cabeça apoiada
numa pequena almofada.
10
Abdominal crunch
A partir da posição inicial (Fig.4): foi
solicitado ao sujeito que executasse o
exercício de abdominal crunch. Comandos
para a execução do exercício “levante a
cabeça, leve o queixo ao peito e toque com
os dedos nos joelhos, mantenha –se nessa
posição durante três segundos e volte à
posição inicial.
Figura 5 - Exercício - Abdominal crunch
Ensino - Drawing in abdominal
A fim de facilitar a aprendizagem e
permitir a visualização tanto pelo
fisioterapeuta como pelo sujeito do
trabalho específico do músculo transverso
do abdómen, principal actor do exercício
de drawing in abdominal a sonda foi
deslocada para o bordo superior da crista
ilíaca. E foi pedido ao sujeito que
executasse o exercício. Seguidamente a
sonda voltou a ser colocada
Figura 6 - Ensino do exercício drawing in transversalmente na linha média do
abdominal abdómen de forma a obter as imagens da
DIR no exercício de drawing in.
Drawing in abdominal
A partir da posição inicial (Fig 4) foi
solicitado ao sujeito que efectuasse o
exercício de “drawing in abdominal”.
Comando para a execução do exercício:”
Inspire normalmente - deite o ar fora -
cole o umbigo às costas - mantenha o
umbigo colado às costas durante três
segundos e descanse.
11
Registo das imagens
Imagem em repouso: Foi solicitado ao
sujeito que respirasse normalmente e no
final de uma expiração normal, que
identificámos pelo movimento do tórax,
foi feito o registo da imagem.
Imagens em contracção: foi solicitado
ao sujeito que mantivesse a posição
durante três segundos e aí foi registada a
imagem. As imagens foram gravadas no
ecógrafo e numa pen em simultâneo
procedendo-se posteriormente às medições
em modo offline. Foram feitas três
Figura 9 - Forma de obtenção das imagens imagens de cada exercício pelo mesmo
examinador tendo sido seleccionada a que
reunia as melhores características de
nitidez e contraste.
A medição da DIR foi feita através de software específico (Matlab, Image Processing
Toolbox, Mathworks Matlab, USA). As imagens de ultra-som foram assumidas como um
sistema de coordenadas em pixels com origem no canto superior esquerdo da imagem.
Neste sistema cada ponto da imagem pode ser descrito por uma coordenada “χ” ou “γ“ e
ser calculada a distancia entre estas coordenadas.
Nas imagens ultrasónicas a DIR foi descrita pela distância linear transversa desde a
parte média do bordo do recto do abdómen de um lado à posição correspondente do recto
do abdómen do lado oposto. Usando este procedimento, devem ser identificados nas
imagens ultrasónicas, dois pontos que correspondem aos locais de inserção da linea Alba
em ambos os bordos médios dos rectos do abdómen. Da nossa observação estes pontos
corresponderiam à inflexão de uma parábola delimitada pelo contorno de ambos os
músculos rectos do abdómen. Assim, e no intuito de melhorar a capacidade de
identificação destes dois pontos, foi desenvolvido e implementado um algoritmo usando
um código personalizado de Matlab. O primeiro passo na definição do algoritmo foi
interpolar uma série de 8-10 pontos marcados digitalmente pelo examinador, assinalando o
contorno visível de ambos os músculos e integrá-los numa curva parabólica (Figura 10 -
A). Usando as coordenadas dessa série de pontos digitalizados e com recurso a uma
equação polinomial de quarta ordem foi possível determinar o coeficiente do polinómio e
obter pontos de interpolação e ajustar uma curva parabólica. Com base nestes pontos foi
12
calculado o ponto de inflexão da parábola sendo este correspondente à derivada discreta da
coordenada interpolada de “χ” no ponto em que aquela muda de sinal. As coordenadas do
ponto de inflexão da curva parabólica foram sobrepostos à imagem ultrasónica original,
servindo de guia ao examinador na identificação das extremidades da linea alba e deste
modo melhorar a exactidão da medição da DIR (Figura 10 - B).
A B
13
3 Resultados
Na figura 11 apresentam-se os valores médios da DIR e respectivos desvios-padrão nas
condições em estudo: repouso, abdominal crunch, drawing in e drawing in com abdominal
crunch.
30
25
Distância Inter-Rectos Abdominais (mm)
20
15
10
0
Repouso Abd Crunch Drawing-in AbdCr+Di
14
30
Cesarianas
25
Distância Inter-rectos (mm)
Vaginal
20
15
10
0
Repouso Abd Crunch Drawing-in AbdCr+Di
15
4 Discussão dos Resultados
A parede abdominal produz e resiste a forças que se exercem em várias direcções
concorrentes entre si. Como exemplos destas forças temos o stress imposto pelas fibras
musculares e a força hidrostática intra-abdominal, que actua de dentro para fora sobre a
musculatura abdominal e cuja magnitude está relacionada com a intensidade da contracção
muscular (Axer et al., 2001).
Muitos têm sido os exercícios apontados como ideais para um fortalecimento dos
músculos abdominais num período após o parto mas, escassos têm sido os estudos que
mostrem a sua eficácia e a sua acção nos músculos da parede abdominal e LA. A
elaboração de programas de treino para o reequilíbrio da musculatura abdominal numa fase
pós parto, exige um entendimento do comportamento das várias estruturas em resposta a
um programa a implementar.
Este estudo foi desenhado com o intuito de observar as alterações da distância inter-
rectos e consequentemente da largura da LA. A escolha destes parâmetros teve a ver com o
facto de na literatura estarem os mesmos relacionados com a instabilidade do tronco,
disfunção dos músculos do pavimento pélvico, disfunção da coordenação dos músculos da
parede abdominal e ainda por serem um dos pontos-chave da avaliação do fisioterapeuta na
mulher após o parto, constituindo um elemento de referência para a sua actuação em
termos de reequilíbrio muscular Estes parâmetros foram avaliados na condição de repouso
e em diferentes condições de contracção dos músculos abdominais.
No nosso estudo verificámos que a distância inter-rectos foi significativamente menor
nas condições de contracção abdominal (abdominal crunch, drawing in e drawing in com
abdominal crunch) do que na condição de repouso. Curiosamente, nas condições de
contracção abdominal foi no exercício de abdominal crunch que se registou um menor
valor de DIR e no exercício de drawing in um valor maior. Apesar destas diferenças não
serem estatisticamente significativas, são sugestivas de que as forças laterais produzidas
pela contracção dos músculos transverso do abdómen e oblíquos, nas condições de
drawing in parecem dominar o efeito da força longitudinal produzida pelos músculos
rectos do abdómen o que vai de encontro ao estudo de Brown (2008) pensando-se que é o
tecido conjuntivo que intervem nestes músculos (especificamente os tendões transversais
do RA e a LA) que vai facilitar a acomodação de tal distribuição de forças.
No sujeito #15 onde os valores da DIR foram muito superiores ao resto da amostra tanto
em repouso como em contracção, verificou-se que na condição de contracção o maior valor
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da DIR correspondeu não ao exercício de drawing in mas sim ao exercício de drawing in
com abdominal crunch o que poderá estar relacionado com a descoordenação da
contracção dos vários músculos abdominais provocada por uma menor tensão da LA, mais
estirada e por isso incapaz de gerar tensão capaz de contrariar as forças laterais.
Por outro lado e de acordo com estudo de Cholewicki et al. (2002) existe uma relação
entre a pressão intra-abdominal (PrIA) e a activação da musculatura abdominal. Durante o
ciclo respiratório há um recrutamento da musculatura abdominal com uma provável
deformação do tecido conjuntivo, provocada pela própria contracção muscular, pela
simples distensão abdominal e aumento da pressão intra-abdominal. Tendo em
consideração este facto no nosso estudo foi solicitado aos sujeitos que não alterassem a sua
respiração quando da captação das imagens em repouso e, nas condições de contracção a
medição da DIR foi feita no final da expiração a fim de evitar os efeitos provocados pela
manobra de Valsalva. No entanto é possível, que para manter a posição o sujeito tenha
feito alguma apneia no final da contracção o que pode ter provocado um aumento da PrIA
e levado a uma maior solicitação das forças laterais em detrimento das forças longitudinais
produzidas pelo RA.
Por este ser o único sujeito que apresenta valores diferentes da DIR pensamos que é de
todo o interesse verificar o comportamento da DIR em situações que fujam às que ocorrem
na maioria dos sujeitos. A necessidade de obter medidas rigorosas no estudo da DIR levou-
nos a utilizar a ultrasonografia. Recentemente tem sido usada a ultrasonografia para avaliar
a geometria muscular e como meio indirecto de medição do nível de activação muscular,
através da visualização das alterações na espessura do músculo (Rankin et al., 2006;
Stokes et al., 2005). De acordo com Whittaker et al. (2011) uma imagem ultrasónica
convencional, em escala de cinzentos e em B-mode (brightness mode), dá-nos informação
sobre a ecogenicidade ou propriedades reflectivas de um tecido, assim como sobre as
características arquitectónicas (ex: forma e tamanho) de uma estrutura. Embora a
ressonância magnética seja apontada por muitos autores como o “gold standard” para a
medição das características arquitectónicas de um músculo (Coldron, Yvonne et al., 2008;
Whittaker & Stokes, 2011), no nosso estudo utilizámos a ultrasonografia para efectuar as
medições inter-rectos não só por já ter sido demonstrado por outros autores ser um método
rigoroso e fiável de medição da DIR (Coldron, Yvonne et al., 2008; Liaw, L. J. et al.,
2011; Mendes et al., 2007) mas também por ser menos dispendiosa, mais fácil de utilizar e
o aparelho poder ser portátil o que nos facilitou o acesso à amostra.
17
A particularidade dos parâmetros do nosso estudo levou-nos a criar uma forma de
“desenhar” os músculos rectos do abdómen e a LA com o intuito de facilitar a medição
exacta da DIR. Na amostra em questão temos não só uma unidade músculo tendinosa
alterada fazendo com que a imagem obtida dos músculos RA e da LA via sistema de
ultrasons esteja também alterada em comparação como uma população normal. O músculo
que habitualmente por ser muito irrigado de sangue aparece mais escuro na imagem
(hipogénico) em contraste com as fáscias que o rodeiam ou nele intervêm que são
estruturas de colagénio densamente organizadas e por isso muito brilhantes (hipergénicas),
no período pós-parto, nem sempre esta distinção é de fácil visualização havendo em alguns
casos uma quebra da homogeneidade e áreas do músculo RA com uma maior
ecogeneicidade (Coldron, Y. et al., 2008). A elevada ecogeneicidade do músculo RA nesta
fase foi atribuída á infiltração de tecido não contráctil tal como a gordura ou colagénio. Por
estas razões os contornos musculares são mais difíceis de visualizar e consequentemente
também se torna mais difícil efectuar uma medição da DIR. Assim, a construção de um
algoritmo usando um código personalizado de Matlab que resultou da interpolação de uma
série de 8-10 pontos marcados digitalmente pelo examinador, assinalando o contorno
visível de ambos os músculos tendo sido integrados numa curva parabólica, permitiu que
as coordenadas do ponto de inflexão da curva parabólica fossem sobrepostos à imagem
ultrasónica original, servindo de guia ao examinador na identificação das extremidades da
linea alba e deste modo melhorar a exactidão da medição da DIR.
O tamanho da amostra, o local da medição da DIR, ser um estudo do tipo cohort,
amostra exclusiva de mulheres primíparas e o facto de não termos tido em conta o efeito da
PrIA são algumas das limitações do nosso estudo. O tamanho da amostra foi limitado pelo
tempo de que dispúnhamos para efectuar o estudo. O facto de as medidas da DIR terem
sido feitas num só local (2 cm acima do umbigo) que de acordo com os estudos de Coldron
et al. (2008) e de Liaw et al. (2011) não permite ter uma noção tão nítida da DIR ao longo
de todo o RA embora, os 2cm acima do umbigo, sejam referidos por vários autores
(Boissonnault & Blaschak, 1988; Coldron, Y. et al., 2008) como sendo o local onde a DIR
é habitualmente maior. Outra das limitações prende-se com o facto de ser um estudo do
tipo cohort, não permitindo uma panorâmica real do que acontece ao longo do percurso
desde o final da gravidez e os primeiros seis meses de vida, o que em termos de
recuperação nos parece de toda a pertinência conhecer. A multiparidade parece ser uma das
causas de aumento da DIR o que pelas suas implicações deveria ser também incluído em
18
estudos futuros Apesar de conhecermos os efeitos da PrIA nas várias estruturas no nosso
estudo não foi tida em consideração pelo que, pensamos ser de todo o interesse incluir este
parâmetro em futuros estudos.
5 Conclusões
A principal conclusão a que o estudo nos remete é que a contracção dos músculos
abdominais diminui significativamente a distância inter-rectus quando comparada com a
condição de repouso. No entanto entre as três condições de contracção estudadas não
foram encontradas diferenças significativas da DIR. Apesar de todas as limitações deste
estudo ele levantou o véu das necessidades de um conhecimento mais fundamentado e
aprofundado sobre a intervenção do fisioterapeuta em mulheres após o parto.
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6 Agradecimentos:
A todas as mulheres/mães e respectivos bebés que se voluntariaram para participar neste
estudo.
Á Fisioterapeuta Patrícia Mota pela sua grande ajuda na recolha e medição das imagens
Ao Rodrigo que com toda a sua paciência ajudou em todo o processamento informático
das imagens e sua respectiva medição.
Á minha amiga Isabel Guerra pelo seu apoio e revisão cuidadosa da tese
Ao meu orientador Professor Doutor Augusto Gil Pascoal pelo cuidado e rigor que
impôs a todo o processo.
A todos os meus amigos e família por me aturarem e ajudarem em tudo o que puderam
para que este projecto chegasse ao fim
Ao responsável pelo Gabinete de Fisioterapia - R’equilibriu´s - , Professor Doutor Raul
Oliveira, que permitiu e facilitou que este estudo pudesse decorrer no seu Gabinete de
Fisioterapia.
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