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Entre o dever e o direito

2008, Juris Revista Da Faculdade De Direito

Abstract

Neste trabalho, buscaremos delimitar dois institutos jurídico-penais: o estrito cumprimento de dever legal e o exercício regular do direito. Desde logo, cabe salientar o mérito do nosso legislador ao fazer a diferenciação referida(art.23, III do CP). A consagração legislativa dessas figuras permite aos nossos tribunais e à nossa doutrina aí tratar variadas hipóteses que, em outros países, tem-se dificuldade de sistematizar 1 , tanto que, entre nós o tema da admissibilidade de causas de exclusão da ilicitude não previstas taxativamente pela lei não tem despertado o mesmo interesse que alhures. 2 Embora não falte quem, como Salgado Martins, sustente haver identidade entre o estrito cumprimento de dever legal e o exercício regular do direito, a maioria dos autores que se dedicam ao exame da matéria, tanto estrangeiros quanto nacionais, apontam, a nosso ver corretamente, traços de dessemelhanças entre um e outro. O Prof. José Salgado Martins, na defesa de seu entendimento, argumenta: Não há direito sem dever correlato. Não há dever a que não corresponda um direito. O fato praticado, no estrito cumprimento de dever legal, o foi porque o agente tinha o direito de praticá-lo. Reciprocamente, se ato resultou do exercício regular de direito, o agente tinha, ao mesmo tempo, o dever de assim agir, isto é, conforme à norma de direito. 3

Key takeaways

  • Assim é que o Prof. Galdino Siqueira teve o especial cuidado de assinalar: 'São casos distintos, porquanto no primeiro cumprimento estrito de dever legal, se compreendem as ações que a lei diretamente determina e que o sujeito diretamente cumpre, posto que no segundo caso, no exercício regular de direito, se compreende ações que a lei não proíbe 4 .
  • Em relação à atuação do médico nas hipóteses em que nosso Código Penal não pune o aborto, é preciso dizer que sua intervenção (havendo consentimento da gestante) nos casos em que a gravidez resulta de estupro estará justificada pelo exercício regular do direito.
  • Idêntica ponderação é de ser feita no tocante à operação cirúrgica, quando desta, embora preconizada pela ciência e executada proficientemente, resulte a prematura morte do paciente.Também aqui, a imunidade penal não decorre da legitimidade objetiva do resultado letal, mas porque este se apresenta como uma infelicitas fati, não podendo ser imputado a título de dolo ou culpa 32 .
  • O poder familiar é um complexo conceito jurídico que compreende não apenas prerrogativas, mas também uma série de obrigações.
  • Porém, não é preciso recorrer ao estrito cumprimento de dever legal para afastá-las da esfera penal.