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Matriarcado em Terreiros de Mina do Maranhão: Realidade ou ilusão

2001, Revista Ciências Humanas: Dossiê Religião e …

O trabalho versa sobre as relações entre gênero, religião e poder nas religiões afro-brasileiras, tomando como referencia o Tambor de Mina do Maranhão. Analisando-se o papel e a posição da mulher no Tambor de Mina, mostrase que o matriarcado, dominante nos terreiros maranhenses fundados por africanas no século XIX, que conseguiram chegar aos nossos dias, convive na capital maranhense com chefias masculinas coadjuvadas e legitimadas por mulheres, e com lideranças masculinas não mais apoiadas no saber e no poder feminino encontradas em número significativo de terreiros mais novos. Destaca-se ainda que, apesar da mulher ser maioria naquela denominação religiosa, de ter uma posição vantajosa no Tambor de Mina, e de se observar na Mina um enaltecimento das entidades espirituais femininas, a representação dessas entidades encontrada ali reproduz ideologias machistas, legitimando e reforçando a inferioridade ou a exclusão social da mulher. Palavras-chave: Religião afro-brasileira; matriarcado; mulher-representação INTRODUÇÃO Nas casas de culto de matriz africana do Maranhão definidas como Tambor de Mina a mulher, além de ser maioria, costuma ter posição muito elevada, o que nem sempre ocorre em outros contextos da sociedade brasileira marcada pelo machismo. Essa posição vantajosa da mulher é também encontrada no Candomblé da Bahia e em outras denominações religiosas afro-brasileiras 3. No final da década de 1930 e durante a década seguinte muito se discutiu a respeito da existência de um matriarcado nos terreiros de Candomblé da Bahia. A polemica foi desencadeada por trabalhos de Ruth Landes chamando a atenção para o poder das mães-desanto em terreiros tradicionais e para a presença de "adés" (homossexuais masculinos) em casas de culto afro-brasileiro, principalmente nas de caboclos 4. Apesar de alguns autores questionarem atualmente a existência desse matriarcado nos terreiros mais antigos da Bahia, afirmando que o crescimento do poder feminino ocorreu mais nos terreiros jeje-nagô do que nos bantu ou principalmente após a abolição da escravidão (PARÉS, 2006), a idéia de que o matriarcado está ligado à origem e à essência das religiões afro-brasileiras é bastante afirmada entre pesquisadores e lideranças religiosas. Como lembra Maria Lina Teixeira: Os terreiros de candomblé têm sido percebidos por estudiosos, literatos e público de maneira geral como espaços primordialmente femininos. Desde Nina Rodrigues e Xavier Marques permaneceu subjacente aos escritos de Edson Carneiro, Ruth Landes, Roger Bastide, Pierre Verger e Jorge Amado, entre outros (In: MOURA, 2000, p.197). Na época da pesquisa de Ruth Landes (1937) e quando ela escreveu os artigos incluídos nas edições brasileiras de Cidades das Mulheres, nos terreiros tidos como mais tradicionais da Bahia, os homens eram também minoria e não eram aceitos recebendo orixás e voduns em rituais públicos, mas já eram maioria nas casas de caboclo (LANDES, 2002). Em São Luís, fala-se da existência do século XIX de pelo menos dois pais-de-santo: Manoel Teus Santos e Pai César, com terreiros na Madre Deus, onde hoje se encontra o Hospital Geral, e na