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Apresentação - Letras

2014, Letras

Abstract

A permeabilidade do termo "Early Modern", usado hoje em países de língua inglesa para definir um período da história cuja extensão, início e fim estão abertos a discussões, faz justiça à percepção de muitos intelectuais de que algo fundamental ocorre nesse período que se relaciona com a modernidade. É o período da descoberta da América por Cristóvão Colombo, da Reforma Religiosa que repartiu a Europa em dois campos, da emergência das primeiras narrativas utópicas, da nova perspectiva na pintura, dos grandes tratados políticos, do surgimento de um tipo de escritura "de ensaio" como a de Montaigne, da representação do político no teatro, mas também o período em que antigas categorias religiosas se deterioraram ou se renovaram. É um período, ao mesmo tempo, em que antigos anseios messiânicos, eternos em sua atemporalidade, encontraram aplicação nos conflitos políticos do período. Se a escrita do ensaio, pela primeira vez explorada por Montaigne, revelou um interesse incomum pela escritura incompleta, tateante e indagativa, por outro lado as formas da retórica conservam seu prestígio ao longo de dois séculos, uma tradição que, no terreno civil e político, desfrutava de mais reconhecimento do que outras formas de escritura. É o período que arrisca dar o passo crucial de elevar seus reis ao poder absoluto ou ainda a destroná-los, colocando em xeque a mística monárquica longamente gestada em períodos anteriores. É o momento em que novas ciências surgem: um novo direito que reforça as instâncias do direito comum, uma nova medicina que se debruça sobre doenças, físicas e psíquicas, criando com mais vigor uma distinção entre as doenças de espírito e a mera possessão, reivindicando áreas antes monopolizadas pelo saber religioso, teológico e outros. É finalmente o período em que o debate político sobre o poder ganha já os contornos dramáticos que revelam a colisão entre uma visão patriarcal e hierárquica do poder e uma visão ainda tateante e indecisa que postula noções como a do poder independente do estado em relação aos monarcas. Na poesia e na literatura de modo geral, é o momento também em que emerge, sobretudo no teatro e no romance, um tipo de representação que tira sua qualidade e sua textura da observação do humano. Assim no drama shakespeariano e do Século de Ouro, assim na escritura de Montaigne, na incrível