65 70 75 80 85 90 SôboloS rioS que vão LXXIII Ditoso quem se partir para ti, terra excelente, tão justo e tão penitente que, despois de a ti subir lá descanse eternamente. (Rimas, Redondilhas 117, pp. 105-114) 1. 1.1. As redondilhas conhecidas pela designação de Babel e Sião e também pelo seu verso inicial, Sobre os rios que vão (segundo a primeira edição, Rimas: 1595) ou, mais eufonicamente, Sobollos rios que vão (segunda edição, Rimas: 1598), são compostas por 365 versos, o que terá sido notado, pela primeira vez, por Agostinho de Campos em 1924 (Camões lírico, reed.), quase três séculos e meio após aquela primeira edição da lírica camoniana. Jorge de Sena, que chama a atenção, na edição de 1598, para uma nítida «obsessão de eliminar todos os hiatos possíveis», explica a modificação do incipit em virtude dessa preocupação (Sena 1980). A contracção da preposição sobre com o artigo definido «o», «a», «os», «as» é arcaica e ocorre na nossa língua desde pelo menos o século XIII (superlos > supellos > sobelos > sobolos). Os dois cancioneiros adiante referidos apresentam a forma Sobre os, tal como a edição de 1595, à qual pelo menos o Cancioneiro de Cristóvão Borges é anterior. O hiato vocálico só foi remediado na edição de 1598, na tese de Sena por intervenção «abusiva» do editor, mas sem que tal se imponha como conclusão definitiva. Por três razões: Em primeiro lugar, porque o próprio Camões empregou a forma «sôbolo» em Os Lusíadas: «Sôbolo tanque lúcido e sereno» (IX 60, 6). Anota Faria e Sousa: «modo Portugues de que el Poeta se aprovechó, porque si dixera, sobre o, quedava el numero manco», que no mesmo lugar menciona expressamente o caso destas redondilhas, opinando todavia que, nelas, Sobre os terá sido mal emendado para Sobollos, uma vez o poeta teria preferido aquela forma, «cayendose el verso aprissa por falta de numero, por expressar el caer de los rios» (Lusiadas II 1639)… Em segundo lugar, porque dado o breve espaço de tempo que medeia entre as duas primeiras edições da lírica camoniana, a edição das Rimas datada de 1595 só pode ter começado a circular em 1596, uma vez que o 365 de Cristóvão Borges, este de 1578, o mais tardar,