Papers by Sérgio Ferreira

Open Linguistics, 2019
The linguistic rights of Mirandese were enshrined in Portugal in 1999, though its “discovery” dat... more The linguistic rights of Mirandese were enshrined in Portugal in 1999, though its “discovery” dates back to the very end of the 19th century at the hands of Leite de Vasconcellos. For centuries, it was the first or only language spoken by people living in the northeast of Portugal, particularly the district of Miranda do Douro. As a minority language, it has always moved among three dimensions. On the one hand, the need to assert and defend this language and have it acknowledged by the country, which proudly believe(d) in their monolingual history. Unavoidably, this has ensued the action of translation, especially active from the mid of the 20th century onwards, with an emphasis on the translation of the Bible and Portuguese canonical literature, as well as other renowned literary forms (e.g. The Adventures of Asterix). Finally, the third axis lies in migration, either within Portugal or abroad. Between the 1950s and the 1960s, Mirandese people were forced to leave Miranda do Douro ...

Open Linguistics, 2019
The linguistic rights of Mirandese were enshrined in Portugal in 1999, though its "discovery" dat... more The linguistic rights of Mirandese were enshrined in Portugal in 1999, though its "discovery" dates back to the very end of the 19th century at the hands of Leite de Vasconcellos. For centuries, it was the first or only language spoken by people living in the northeast of Portugal, particularly the district of Miranda do Douro. As a minority language, it has always moved among three dimensions. On the one hand, the need to assert and defend this language and have it acknowledged by the country, which proudly believe(d) in their monolingual history. Unavoidably, this has ensued the action of translation, especially active from the mid of the 20th century onwards, with an emphasis on the translation of the Bible and Portuguese canonical literature, as well as other renowned literary forms (e.g. The Adventures of Asterix). Finally, the third axis lies in migration, either within Portugal or abroad. Between the 1950s and the 1960s, Mirandese people were forced to leave Miranda do Douro and villages in the outskirts in the thousands. They fled not only due to the deeply entrenched poverty, but also the almost complete absence of future prospects, enhanced by the fact that they were regarded as not speaking "good" Portuguese, but rather a "charra" language, and as ignorant backward people. This period coincided with the building of dams on the river Douro and the cultural and linguistic shock that stemmed from this forceful contact, which exacerbated their sense of not belonging and of social shame. Bearing all this in mind, we seek to approach the role that migration played not only in the assertion of Mirandese as a language in its own right, but also in the empowerment of new generations of Mirandese people, highly qualified and politically engaged in the defence of this minority language, some of whom were former migrants. Thus, we aim to depict Mirandese's political situation before and after the endorsement of the Portuguese Law no. 7/99.

Ecolinguismo e línguas minoritárias, 2016
As línguas minoritárias enfrentam barreiras internas e externas que impedem o seu desenvolvimento... more As línguas minoritárias enfrentam barreiras internas e externas que impedem o seu desenvolvimento, devido à sua natureza de línguas e culturas não dominantes e à sua fraca representação (e representatividade) na política e na sociedade. A tradução de literatura
canónica da cultura ou religião dominantes para a língua minoritária é de importância fulcral para a afirmação destas línguas, assim como para o acesso aos mais diversos meios de comunicação. A Catalunha surge como um exemplo de forte investimento na função destes meios e na utilização do catalão na rádio, televisão, teatro e cinema, a par da
tradução que ocorre nestes meios (i.e. legendagem, dobragem e audiodescrição). Para além disso, não se deve negligenciar o peso da ciberesfera, que possibilita às línguas minoritárias entrarem no mundo virtual, por meio de blogs, páginas da Wikipedia, redes sociais e afins.
Em 1999, estabeleceu-se legalmente o reconhecimento oficial dos direitos linguísticos da comunidade mirandesa, aproximadamente 100 anos depois de Leite de Vasconcellos ter produzido a obra Estudos de Filologia Mirandesa, evidenciando a ancestralidade e importância desta língua de origem asturo-leonesa. (cf. Vasconcelos, José Leite, 1900-1901). Depois desta data, o enquadramento legal para o mirandês e a sua normalização linguística foram estabelecidos, nomeadamente por meio do seu acordo ortográfico, que consolidou o ensino da língua. Quinze anos depois, em 2014, a Associação de Língua Mirandesa (ALM) foi refundada e transferida de Lisboa para Miranda do Douro, com o propósito de fomentar a investigação e o ensino da língua, assim como recolher e preservar o património imaterial, no qual a tradução não está diretamente implicada. Desta forma, na nossa perspetiva, ainda se vislumbra a necessidade de introduzir uma forte política linguística, dentro da qual um Departamento de Tradução possa estar inserido, com vista à revitalização da língua e à consolidação da sua literatura.
Identifica-se também a ausência de um corpo de tradutores profissionais que sejam simultaneamente proficientes em português e em mirandês, uma vez que o ensino do mirandês se restringe grandemente a Miranda do Douro e como disciplina optativa. No
entanto, a tradução de português e outras línguas estrangeiras para mirandês é desenvolvida por uma elite intelectual que investe nesta atividade aliada, por vezes, à produção também em mirandês. Este é o caso de Amadeu Ferreira, um académico de destaque que deixou de estar entre nós em março de 2015 e foi responsável por um número
substancial de obras. O seu percurso é de particular relevância, não só porque o mirandês acusava a ausência de literatura canónica traduzida, na linha do que existe em português, mas também de literatura ficcional, sem deixar de referir obras de referência em termos lexicográficos e gramaticais. No cômputo das suas obras, são de referir a tradução para
mirandês dos “Quatro Evangelhos”, “Lusíadas” de Luís Vaz de Camões e “A Mensagem” de Fernando Pessoa, obras de Horácio, Virgílio e Catulo e aventuras de Astérix. A par da tradução, escreveu igualmente ficção sob pseudónimos, que possibilitaram a expansão do património literário em mirandês. Colaborou ainda com meios de comunicação social regionais e escreveu textos em diversos blogs. Neste contexto, o nosso projeto direciona-se para a recolha de informação relativa a todas as obras traduzidas para mirandês, destacando as línguas das quais foram traduzidas, os tradutores que as realizaram e os seus perfis. Este exercício permitir-nos-á refletir criticamente sobre as obras que foram eleitas para tradução, as razões que possivelmente ditaram esta escolha e o impacto que estas produziram nesta comunidade linguística com
aproximadamente 10 000 falantes. Todo este esforço de tradução e produção literária tem adiado o desaparecimento do mirandês, que tantos previam que já se tivesse verificado; mas será o mirandês capaz de sobreviver no século XXI?

II. Economia de Fronteira
Sérgio Ferreira e Xerardo Pereiro
Nesta sessão, o grupo de trabalho foi... more II. Economia de Fronteira
Sérgio Ferreira e Xerardo Pereiro
Nesta sessão, o grupo de trabalho foi desafiado a perspetivar o
conceito de fronteira segunda a ótica das ciências sociais e humanas.
Assim, procurou-se explorar a íntima relação entre território
de fronteira, entendido como espaço dotado de caraterísticas
próprias, e agentes sociais nele presentes, contribuindo para a
sua dinâmica e transformação social.
Ao explorarem a economia de fronteira, centraram-se em aspetos distintos, com pressupostos oriundos da sociologia e da antropologia, recorrendo a exemplos práticos a partir de estudos centrados na língua e cultura mirandesas (Sérgio Ferreira) e da potencialidade do turismo em regiões de fronteira (Xerardo Pereiro).
No processo de construção social da fronteira, destacou-se
a permeabilidade e plasticidade dos movimentos transfronteiriços, superando as tradicionais definições de fronteira marcadas pela rigidez e formalidade jurídico-legal. Ficou demonstrado que a organização política e administrativa, especificamente em zonas de fronteira, não se sobrepõe inteiramente à organização social dos grupos e indivíduos que procuram desenvolver estratégias de cooperação económica (indubitavelmente assimétricas). Para além disso, concluiu-se que este é um espaço pautado por fortes constrangimentos produtivos e por baixos níveis de dinamismo económico. As línguas minoritárias e todo o manancial cultural e patrimonial que as contextualiza, quer no espaço português, quer no espaço espanhol, permite-nos reequacionar o conceito de turismo de fronteira. Finalmente, ressalvou-se a transversalidade deste tema a outros como a multiculturalidade, cooperação transnacional, a par dos processos de reinvenção dos espaços fronteiriços (reinvenção dos próprios modos de vida rurais) através da patrimonialização e turistificação que advém do aproveitamento e maximização das potencialidades dos locais e das gentes que neles ainda habitam.

Avanca Cinema 2012, Jul 2012
The screen, be it the cinema screen or the home screen, is acknowledged almost unanimously as a p... more The screen, be it the cinema screen or the home screen, is acknowledged almost unanimously as a powerful means for the assertion of national languages or prestigious standards. Despite this, its power can also be extended to the defence of minority languages, official or not, and two of the most outstanding examples are the Catalan Regional Channels, such as TV3, EI33, or Canal Nou, and bilingual subtitling practices in Belgium (in French and Flemish). As far as Portugal is concerned, Mirandese became the second official language in 1999, a language spoken in Miranda do Douro, in the north-eastern part of Portugal, by about 10,000 speakers. It was “discovered” at the end of the 19th century by Leite de Vasconcellos, and only then did it meet its first written forms; the first spelling convention dates from 1999. Since Leite de Vasconcellos, many literary works, newspaper articles and translation of Portuguese classics have been put forth by various authors. However, the screen has not yet been conquered by Mirandese for economic and political reasons. We intend to answer some questions: What is there still to be achieved? What could the screen bring its speakers? Could the screen enable to bridge the generation gaps, to encourage the speakers’ self-esteem and identity?
This paper aims at presenting the ongoing doctorate research which focuses on the Mirandese langu... more This paper aims at presenting the ongoing doctorate research which focuses on the Mirandese language and culture, as well as the deconstruction of Portuguese history as far as the lands of Miranda are concerned. By offering a set of relevant sociological data, we intend to allow access to a different and critical reading, though complementary, about the production modes, diffusion and use of a language that was mainly popular, rural and transmitted orally, but that is now the second Portuguese official language, with solid writing. This re-reading of the last 60 years will enable the understanding of how the past was the way it did and how the transmission and reproduction of the Mirandese language will be restructured in its present and future.
Keywords: Mirandese language and culture; minority languages; identity; sociology of culture.

Neste poster pretende-se expor os principais objectivos do projecto de investigação desenvolvido ... more Neste poster pretende-se expor os principais objectivos do projecto de investigação desenvolvido no Curso de Doutoramento em Sociologia - Desigualdades, Cultura e Território (2007-2012), da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, ainda em fase inicial e exploratória, mas já determinado por motivações específicas e opções de ordem teórica e metodológica que permitem desenhar um quadro inicial de questões, hipóteses de trabalho e trajectos de pesquisa. Pretende-se abordar a área das línguas minoritárias (caso mirandês)face aos seus condicionalismos sociais e políticos, bem como oferecer um conjunto de dados sociológicos que permitam aceder a uma leitura diferente sobre os modos de produção, difusão e utilização de uma língua outrora popular, rural e transmitida oralmente e, actualmente, língua oficial portuguesa com expressão escrita. O caso mirandês exige um trajecto de investigação a dois tempos distintos que, por sua vez, implica estudar uma dualidade importante: tradição/oralidade versus modernidade/escrita, integrando concomitantemente uma análise de classes (estruturas sociais), dos universos simbólicos e identitárias (práticas simbólico-ideológicas) e uma abordagem sócio-histórica (fenómenos desestruturadores do espaço periférico onde se fala o mirandês) que implicam abordar processos como a escolarização, a emigração, a abertura dos espaços rurais, migrações, entre outros. Pensando na realidade portuguesa, o objectivo de estudar um território periférico, de fronteira, desfavorecido, profundamente rural e com a existência de um fenómeno identitário quanto uma língua própria comporta, coloca-nos perante uma importante tarefa de reler a história de um país (falsa e orgulhosamente monolingue)e da sua recente evolução e apurar como se reconfiguraram os cenários de transmissão e reprodução da língua mirandesa. Ao procurarmos desocultar esta realidade complexa estaremos a contribuir com conhecimento aprofundado para que o mirandês se continue a falar e agora a escrever e viva como língua legítima.
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Papers by Sérgio Ferreira
canónica da cultura ou religião dominantes para a língua minoritária é de importância fulcral para a afirmação destas línguas, assim como para o acesso aos mais diversos meios de comunicação. A Catalunha surge como um exemplo de forte investimento na função destes meios e na utilização do catalão na rádio, televisão, teatro e cinema, a par da
tradução que ocorre nestes meios (i.e. legendagem, dobragem e audiodescrição). Para além disso, não se deve negligenciar o peso da ciberesfera, que possibilita às línguas minoritárias entrarem no mundo virtual, por meio de blogs, páginas da Wikipedia, redes sociais e afins.
Em 1999, estabeleceu-se legalmente o reconhecimento oficial dos direitos linguísticos da comunidade mirandesa, aproximadamente 100 anos depois de Leite de Vasconcellos ter produzido a obra Estudos de Filologia Mirandesa, evidenciando a ancestralidade e importância desta língua de origem asturo-leonesa. (cf. Vasconcelos, José Leite, 1900-1901). Depois desta data, o enquadramento legal para o mirandês e a sua normalização linguística foram estabelecidos, nomeadamente por meio do seu acordo ortográfico, que consolidou o ensino da língua. Quinze anos depois, em 2014, a Associação de Língua Mirandesa (ALM) foi refundada e transferida de Lisboa para Miranda do Douro, com o propósito de fomentar a investigação e o ensino da língua, assim como recolher e preservar o património imaterial, no qual a tradução não está diretamente implicada. Desta forma, na nossa perspetiva, ainda se vislumbra a necessidade de introduzir uma forte política linguística, dentro da qual um Departamento de Tradução possa estar inserido, com vista à revitalização da língua e à consolidação da sua literatura.
Identifica-se também a ausência de um corpo de tradutores profissionais que sejam simultaneamente proficientes em português e em mirandês, uma vez que o ensino do mirandês se restringe grandemente a Miranda do Douro e como disciplina optativa. No
entanto, a tradução de português e outras línguas estrangeiras para mirandês é desenvolvida por uma elite intelectual que investe nesta atividade aliada, por vezes, à produção também em mirandês. Este é o caso de Amadeu Ferreira, um académico de destaque que deixou de estar entre nós em março de 2015 e foi responsável por um número
substancial de obras. O seu percurso é de particular relevância, não só porque o mirandês acusava a ausência de literatura canónica traduzida, na linha do que existe em português, mas também de literatura ficcional, sem deixar de referir obras de referência em termos lexicográficos e gramaticais. No cômputo das suas obras, são de referir a tradução para
mirandês dos “Quatro Evangelhos”, “Lusíadas” de Luís Vaz de Camões e “A Mensagem” de Fernando Pessoa, obras de Horácio, Virgílio e Catulo e aventuras de Astérix. A par da tradução, escreveu igualmente ficção sob pseudónimos, que possibilitaram a expansão do património literário em mirandês. Colaborou ainda com meios de comunicação social regionais e escreveu textos em diversos blogs. Neste contexto, o nosso projeto direciona-se para a recolha de informação relativa a todas as obras traduzidas para mirandês, destacando as línguas das quais foram traduzidas, os tradutores que as realizaram e os seus perfis. Este exercício permitir-nos-á refletir criticamente sobre as obras que foram eleitas para tradução, as razões que possivelmente ditaram esta escolha e o impacto que estas produziram nesta comunidade linguística com
aproximadamente 10 000 falantes. Todo este esforço de tradução e produção literária tem adiado o desaparecimento do mirandês, que tantos previam que já se tivesse verificado; mas será o mirandês capaz de sobreviver no século XXI?
Sérgio Ferreira e Xerardo Pereiro
Nesta sessão, o grupo de trabalho foi desafiado a perspetivar o
conceito de fronteira segunda a ótica das ciências sociais e humanas.
Assim, procurou-se explorar a íntima relação entre território
de fronteira, entendido como espaço dotado de caraterísticas
próprias, e agentes sociais nele presentes, contribuindo para a
sua dinâmica e transformação social.
Ao explorarem a economia de fronteira, centraram-se em aspetos distintos, com pressupostos oriundos da sociologia e da antropologia, recorrendo a exemplos práticos a partir de estudos centrados na língua e cultura mirandesas (Sérgio Ferreira) e da potencialidade do turismo em regiões de fronteira (Xerardo Pereiro).
No processo de construção social da fronteira, destacou-se
a permeabilidade e plasticidade dos movimentos transfronteiriços, superando as tradicionais definições de fronteira marcadas pela rigidez e formalidade jurídico-legal. Ficou demonstrado que a organização política e administrativa, especificamente em zonas de fronteira, não se sobrepõe inteiramente à organização social dos grupos e indivíduos que procuram desenvolver estratégias de cooperação económica (indubitavelmente assimétricas). Para além disso, concluiu-se que este é um espaço pautado por fortes constrangimentos produtivos e por baixos níveis de dinamismo económico. As línguas minoritárias e todo o manancial cultural e patrimonial que as contextualiza, quer no espaço português, quer no espaço espanhol, permite-nos reequacionar o conceito de turismo de fronteira. Finalmente, ressalvou-se a transversalidade deste tema a outros como a multiculturalidade, cooperação transnacional, a par dos processos de reinvenção dos espaços fronteiriços (reinvenção dos próprios modos de vida rurais) através da patrimonialização e turistificação que advém do aproveitamento e maximização das potencialidades dos locais e das gentes que neles ainda habitam.
Keywords: Mirandese language and culture; minority languages; identity; sociology of culture.
canónica da cultura ou religião dominantes para a língua minoritária é de importância fulcral para a afirmação destas línguas, assim como para o acesso aos mais diversos meios de comunicação. A Catalunha surge como um exemplo de forte investimento na função destes meios e na utilização do catalão na rádio, televisão, teatro e cinema, a par da
tradução que ocorre nestes meios (i.e. legendagem, dobragem e audiodescrição). Para além disso, não se deve negligenciar o peso da ciberesfera, que possibilita às línguas minoritárias entrarem no mundo virtual, por meio de blogs, páginas da Wikipedia, redes sociais e afins.
Em 1999, estabeleceu-se legalmente o reconhecimento oficial dos direitos linguísticos da comunidade mirandesa, aproximadamente 100 anos depois de Leite de Vasconcellos ter produzido a obra Estudos de Filologia Mirandesa, evidenciando a ancestralidade e importância desta língua de origem asturo-leonesa. (cf. Vasconcelos, José Leite, 1900-1901). Depois desta data, o enquadramento legal para o mirandês e a sua normalização linguística foram estabelecidos, nomeadamente por meio do seu acordo ortográfico, que consolidou o ensino da língua. Quinze anos depois, em 2014, a Associação de Língua Mirandesa (ALM) foi refundada e transferida de Lisboa para Miranda do Douro, com o propósito de fomentar a investigação e o ensino da língua, assim como recolher e preservar o património imaterial, no qual a tradução não está diretamente implicada. Desta forma, na nossa perspetiva, ainda se vislumbra a necessidade de introduzir uma forte política linguística, dentro da qual um Departamento de Tradução possa estar inserido, com vista à revitalização da língua e à consolidação da sua literatura.
Identifica-se também a ausência de um corpo de tradutores profissionais que sejam simultaneamente proficientes em português e em mirandês, uma vez que o ensino do mirandês se restringe grandemente a Miranda do Douro e como disciplina optativa. No
entanto, a tradução de português e outras línguas estrangeiras para mirandês é desenvolvida por uma elite intelectual que investe nesta atividade aliada, por vezes, à produção também em mirandês. Este é o caso de Amadeu Ferreira, um académico de destaque que deixou de estar entre nós em março de 2015 e foi responsável por um número
substancial de obras. O seu percurso é de particular relevância, não só porque o mirandês acusava a ausência de literatura canónica traduzida, na linha do que existe em português, mas também de literatura ficcional, sem deixar de referir obras de referência em termos lexicográficos e gramaticais. No cômputo das suas obras, são de referir a tradução para
mirandês dos “Quatro Evangelhos”, “Lusíadas” de Luís Vaz de Camões e “A Mensagem” de Fernando Pessoa, obras de Horácio, Virgílio e Catulo e aventuras de Astérix. A par da tradução, escreveu igualmente ficção sob pseudónimos, que possibilitaram a expansão do património literário em mirandês. Colaborou ainda com meios de comunicação social regionais e escreveu textos em diversos blogs. Neste contexto, o nosso projeto direciona-se para a recolha de informação relativa a todas as obras traduzidas para mirandês, destacando as línguas das quais foram traduzidas, os tradutores que as realizaram e os seus perfis. Este exercício permitir-nos-á refletir criticamente sobre as obras que foram eleitas para tradução, as razões que possivelmente ditaram esta escolha e o impacto que estas produziram nesta comunidade linguística com
aproximadamente 10 000 falantes. Todo este esforço de tradução e produção literária tem adiado o desaparecimento do mirandês, que tantos previam que já se tivesse verificado; mas será o mirandês capaz de sobreviver no século XXI?
Sérgio Ferreira e Xerardo Pereiro
Nesta sessão, o grupo de trabalho foi desafiado a perspetivar o
conceito de fronteira segunda a ótica das ciências sociais e humanas.
Assim, procurou-se explorar a íntima relação entre território
de fronteira, entendido como espaço dotado de caraterísticas
próprias, e agentes sociais nele presentes, contribuindo para a
sua dinâmica e transformação social.
Ao explorarem a economia de fronteira, centraram-se em aspetos distintos, com pressupostos oriundos da sociologia e da antropologia, recorrendo a exemplos práticos a partir de estudos centrados na língua e cultura mirandesas (Sérgio Ferreira) e da potencialidade do turismo em regiões de fronteira (Xerardo Pereiro).
No processo de construção social da fronteira, destacou-se
a permeabilidade e plasticidade dos movimentos transfronteiriços, superando as tradicionais definições de fronteira marcadas pela rigidez e formalidade jurídico-legal. Ficou demonstrado que a organização política e administrativa, especificamente em zonas de fronteira, não se sobrepõe inteiramente à organização social dos grupos e indivíduos que procuram desenvolver estratégias de cooperação económica (indubitavelmente assimétricas). Para além disso, concluiu-se que este é um espaço pautado por fortes constrangimentos produtivos e por baixos níveis de dinamismo económico. As línguas minoritárias e todo o manancial cultural e patrimonial que as contextualiza, quer no espaço português, quer no espaço espanhol, permite-nos reequacionar o conceito de turismo de fronteira. Finalmente, ressalvou-se a transversalidade deste tema a outros como a multiculturalidade, cooperação transnacional, a par dos processos de reinvenção dos espaços fronteiriços (reinvenção dos próprios modos de vida rurais) através da patrimonialização e turistificação que advém do aproveitamento e maximização das potencialidades dos locais e das gentes que neles ainda habitam.
Keywords: Mirandese language and culture; minority languages; identity; sociology of culture.