Papers by Ibraim V I T O R de Oliveira

O cardeal Jacques De Vitry (1165-1240), que viveu e estudou na Universidade de Paris, contemporân... more O cardeal Jacques De Vitry (1165-1240), que viveu e estudou na Universidade de Paris, contemporâneo de Pedro Cantor, assim escreve em seu livro, A história ocidental, sobre Petrus Beatae Mariae Parisiensis: Como açucena entre espinhos e rosas entre urtigas, como anjo de Pérgamo onde está a cadeira de Satanás, como incenso perfumado em dias de verão, como sólido vaso de ouro todo ornado com pedra preciosa, como oliva que germina e cipreste que para o alto se eleva, como celeste tuba e citarista do Senhor, então, era Pedro, mestre do tempo, venerável cantor de Paris, homem potente em obras e discurso. Assim como se fundem ouro e prata, ele equilibra suas palavras, e confere honestidade de costumes, peso e gravidade à sua doutrina. Assim ele começou a agir e ensinar, como lâmpada ardente e brilhante, como cidade colocada sobre o monte, como candelabro de ouro na casa do Senhor em cujas límpidas fontes [...] se saciava (De Vitry, 1855, p. 15, tradução nossa) 1. Petrus Beatae Mariae Parisiensis, diretor por muito tempo da Escola de teologia em Paris (na Escola catedral), por volta de 1180, recebe o apelido de Cantor ao ser nomeado canônico cantor da catedral de Paris, donde, Pedro Cantor, como bem revela Migne (Elogia, 1855a, p. 16, tradução nossa): "homem muito erudito em divinas Escrituras, nobre doutor em filosofia secular, por muitos anos preclaro diretor da Escola de teologia de Paris, instrutor de Este artigo, tradução e comentários são produtos do Projeto de pesquisa "Disputatio: método para o ensino e a pesquisa filosófica", financiado pela FAPEMIG (APQ 01860-17). Artigo recebido em 03/05/2024 e aprovado para publicação em 20/06/2024.

OLIVEIRA, Ibraim Vitor de. “Todo mineiro é um pouco filósofo”. Há uma ética e uma metafísica do ser mineiro. In: MELO, Edvaldo Antônio de; PIETERZACK, Cristiane (Orgs.). A hora dos inconfidentes. Fenomenologia de um tempo lugar. Porto Alegre: Ed. Fi, 2020, p. 74-98., 2020
É muito comum atribuir aos habitantes do montanhoso estado brasileiro de Minas Gerais uma espécie... more É muito comum atribuir aos habitantes do montanhoso estado brasileiro de Minas Gerais uma espécie de parentesco com a filosofia. Batizados de mineiros, parecem encarnar na mineiridade a “amizade pelo saber” e, graças a certa circunspecção vivencial, se diz que lhes apraz exibir nuances de sua essência, de seu ser mineiro. Mas terá realmente alguma valência e legitimidade a expressão segundo a qual “todo mineiro é um pouco filósofo”? Será que existe de fato alguma essência mineira, um ser mineiro? Para meditar sobre esse mistério, alguns aspectos serão aqui ressaltados. Em primeiro lugar, será preciso averiguar se há, realmente, uma realidade filosófica, ético-metafísica do “ser mineiro” a ponto de justificar a afirmação de que todo mineiro é um pouco filósofo. Naturalmente, a justificação de uma tal proposição dependerá de como as palavras filosofia, ética e metafísica serão entendidas. Em segundo lugar, poderá ser muito salutar para o presente propósito verificar traços históricos do acontecer de Minas Gerais na busca de elementos formadores do ethos mineiro e que evidenciem características sedimentadas do modo mineiro de lidar com a vida. Esse percurso terá como pano de fundo o conflito e será possível verificar o quanto conflitiva foi a ocupação de Minas. Uma verdadeira miscigenação e violências de todos os tipos, em menos de meio século, criam o “ser mineiro”, a “mineiridade”. Em suas bases originárias, primeira metade do século XVIII, observa-se a sedimentação de um ethos alimentado por genocídios, crimes, sedições, inconfidências, escravidão, desconfianças, traições... formando um amálgama instantâneo, internalizado sem resolução, visto que a quantidade assustadora de descoberta de ouro exigia soluções rápidas, imediatas.

INCONΦIDENTIA: Revista Eletrônica de Filosofia Mariana-MG, Volume 3, Número 5, janeiro-junho de 2019. Faculdade Dom Luciano Mendes , 2019
Heidegger traz consigo, em todo seu caminho filosófico, como marca indelével, a apropriação que f... more Heidegger traz consigo, em todo seu caminho filosófico, como marca indelével, a apropriação que faz de Aristóteles. Isso se evidencia em pelo menos dois aspectos. Em primeiro lugar, no fato de que ele jamais abandona as intuições fundamentais de Ser e tempo, profundamente centradas no projeto de desconstrução fenomenológica a partir da leitura de Aristóteles, autor que compõe o essencial do “laboratório de Heidegger”. Em segundo lugar, no sentido do “passo atrás” (Schritt zurück) realizado por Heidegger, em algum momento do ano de 1927, em que as concepções especialmente do Estagirita, brilhante síntese da filosofia grega, são assumidas como inaugurais da “história do ser”: Aristóteles é o lugar primordial do “passo atrás” heideggeriano, do “salto” para a origem mais originária, da superação (Überwindung) da metafísica. O presente texto pretende resgatar esses dois aspectos dos encontros de Heidegger com Aristóteles, seguindo a perspectiva segundo a qual, mesmo depois de passar a flertar mais com Nietzsche ou Hölderlin e os pré-socráticos, as intuições aristotélicas jamais se ausentam dos caminhos heideggerianos.

OLIVEIRA, Ibraim Vitor de. Verhaltenheit: manifestação do “outro início” em Heidegger. In: COSTA, Affonso H. V. da et al. (Orgns). Heidegger, Jonas e Levinas. São Paulo: ANPOF, 2019, p. 110-118. ISBN: 978-85-88072-83-1., 2019
Pode-se dizer que o "outro início" da nossa história, anunciado por Heidegger em especial nos Bei... more Pode-se dizer que o "outro início" da nossa história, anunciado por Heidegger em especial nos Beiträge, se efetiva a partir de uma grande decisão tomada pelo homem em lançar-se em seu "aí", lançar-se do homem no Da do Da-sein. Semelhante modo de vida, porém, será plena de oscilação; aqui não vige qualquer segurança que as produções da racionalidade teriam promovido no Ocidente desde as primeiras composições lógicas até os imensos avanços da atual sociedade informatizada. Tal decisão se dá, mais propriamente, aos moldes de um salto do homem no Da (aí) que assim deixa-ser o ente. Para a realização de semelhante salto, exige-se um humor básico, um estado de ânimo fundamental, uma tonalidade afetiva fundamental (Grundstimmung) capaz de suportar a vertigem provocada pela oscilação do salto: a Verhaltenheit

OLIVEIRA, Ibraim Vitor de. Metafísica, reflexões sobre o nada e niilismo filosófico. In: SANTOS, M. G. dos; OLIVEIRA, Ibraim Vitor de (Org.). Tempos da metafísica. Belo Horizonte: Tessitura, 2011, p. 17-52., 2011
O problema inicial poderia ser assim formulado: como vincular metafísica, reflexão sobre o nada e... more O problema inicial poderia ser assim formulado: como vincular metafísica, reflexão sobre o nada e niilismo se, desde suas origens, o que pretende a metafísica é anular o nada diante da emersão do ser? Como refletir sobre o que não é? É possível explicitar o ser do não-ser? Tais questões iniciais já identificam o motivo pelo qual se tornou comum ter certa precaução diante de posturas filosóficas que refletem sobre o nada e o niilismo, em especial, por colocarem em risco o rigor da não-contradição. O presente texto atém-se então ao sentido expresso pelo nihil (nada), base do termo niilismo. Não interessa, aqui, o –ismo. A reflexão recai sobre a palavra-base (nihil) que fala por si mesma. O nada provoca; dá o que pensar ao evidenciar em si mesmo uma profunda antinomia. O texto demarca algumas ocorrências históricas do termo e considera a proposta da filosofia analítica na resolução da antinomia. Depois, no plano ontológico-linguístico, enfatiza-se a concepção de Nietzsche sobre o niilismo em que o nihil (o nada) se diz no nível ontológico e trama uma impreterível dissolução teleológica que promove a liberdade, abrindo espaço para a própria vida e para uma metafísica não violenta.

Sintese, 2011
A recensão apresenta o livro de Paul Gilbert, "Violence et compassion", publicado pela Éditions d... more A recensão apresenta o livro de Paul Gilbert, "Violence et compassion", publicado pela Éditions du Cerf, em 2009. De forma bastante original, o texto insere o tema da violência no âmbito especificamente metafísico. A preocupação central é a de perquirir metafisicamente sobre a violência, indo além das discussões, assaz conhecidas, que permanecem tematizando a "violência da metafísica". Inverte-se o problema. De fato, por muitos aspectos, a metafísica se revelou e se revela violenta, máxime, quando se interessa apenas pelo “uno”, pela universalização exacerbada. Mas, agora, a questão é saber o que a metafísica teria a dizer sobre a violência. De modo muito original, Paul Gilbert diz que "a violência não é para ser evitada”, considerando que, metafisicamente, e no registro da fenomenologia, todo ser é intrinsecamente violento, é "energia de ser": tudo insiste por ser. A grande tarefa do autor será então esclarecer o modo como a "violência" se transformaria em um quinto transcendental. Tudo o que é, por ser, é: i) "uno", ii) "verdadeiro", iii) "bom", iv) "belo" e, agora, v) "violento".

Sapere aude, 2010
O presente texto, ao afrontar o problema da pos-modernidade em filosofia, se depara com Nietzsche... more O presente texto, ao afrontar o problema da pos-modernidade em filosofia, se depara com Nietzsche e Heidegger, geralmente tidos como seus iniciadores. Ambos contestam a modernidade e o pensamento filosofico em geral principalmente por se apoiarem prevalentemente nos ditames da logica que calcula e presta contas. A acusacao e de que tal calculo racional, circunscrevendo a propria vida e se mantendo como unica alternativa de sentido, estabelece o dominio das estruturas da identidade, sem valorizar a diferenca e o diferente. Eles nao acreditam que a vida e o real, sempre assistematicos e anti-predicativos, possam ser assim mensurados, manejados, dominados. Contudo, mesmo que a acusacao por muitos aspectos seja valida, a critica que eles apresentam, para ser comunicada e compreendida, deve ser coerente, deve ser logica. Paradoxalmente, sera preciso usar a logica para ir contra ela. Entao, a dificil tarefa de Nietzsche e Heidegger constitui no fato de se situarem no ambiente da meta-logi...

Anno 19 (2018). ISSN 1128-5478. https://mondodomani.org/dialegesthai/articoli/ibraim-vitor-de-oliveira-01#il-ritegno-verhaltenheit-lo-stile-dell-futuro, 2018
Non ci interessa qui, ne anche è possibile, evidenziare le differenze e le particolare sfumature,... more Non ci interessa qui, ne anche è possibile, evidenziare le differenze e le particolare sfumature, alle volte chiaramente distinte, di Nietzsche e Heidegger in riferimento alla religione. Per il presente proposito, sarà sufficiente all'inizio considerare qualche confluenza che ci permetono rifletere sul tema in Nietzsche e Heidegger senza la perplessità dei parallelismi o l'ingenuità di sottomissioni a vicenda. Per accomunargli, lo stesso se in modo generale, assumiamo la prospettiva secondo la quale Nietzsche e Heidegger si intrecciano nell'inversione procedurale dei loro progetti filosofici: il primo problematizza il telos; il secondo, l'arché. Tutti i due si dano, come progetto filosofico, l'incarico di affrontare e mettere in discussione delle determinazioni razionali, supposte "aeternae veritates" stabilite per organizzare, dirigere e dominare la vita.

Síntese - , 2011
A recensão apresenta o livro de Paul Gilbert, "Violence et compassion", publicado pela Éditions d... more A recensão apresenta o livro de Paul Gilbert, "Violence et compassion", publicado pela Éditions du Cerf, em 2009. De forma bastante original, o texto insere o tema da violência no âmbito especificamente metafísico. A preocupação central é a de perquirir metafisicamente sobre a violência, indo além das discussões, assaz conhecidas, que permanecem tematizando a "violência da metafísica". Inverte-se o problema. De fato, por muitos aspectos, a metafísica se revelou e se revela violenta, máxime, quando se interessa apenas pelo “uno”, pela universalização exacerbada. Mas, agora, a questão é saber o que a metafísica teria a dizer sobre a violência. De modo muito original, Paul Gilbert diz que "a violência não é para ser evitada”, considerando que, metafisicamente, e no registro da fenomenologia, todo ser é intrinsecamente violento, é "energia de ser": tudo insiste por ser. A grande tarefa do autor será então esclarecer o modo como a "violência" se transformaria em um quinto transcendental. Tudo o que é, por ser, é: i) "uno", ii) "verdadeiro", iii) "bom", iv) "belo" e, agora, v) "violento".

Sintese, 2007
A correspondencia entre Leibniz e Arnauld oferece uma excelente oportunidade para se compreender ... more A correspondencia entre Leibniz e Arnauld oferece uma excelente oportunidade para se compreender o registro filosofico leibniziano, o seu desenvolvimento e implicacoes. Sao cartas que, alem de exemplares de um verdadeiro debate academico, nos colocam em contato com as articulacoes filosofico-metafisicas de Leibniz, as quais, distanciando-se de certas caracteristicas do cartesianismo e do ocasionalismo, intentam conciliar pensamento e metodo modernos com a filosofia classica e a teologia. O discurso sobre Deus, substância e liberdade, com base no praedicatum inest subjecto, e justificado pela perspectiva segundo a qual a essencia das substâncias e exprimir e representar o universo. Abstract: The letters between Leibniz and Arnaud provide an excellent opportunity to understand the Leibnizian philosophical system, its development and implications. Besides being samples of a remarkable academic debate, they also facilitate the contact with the metaphysical–philosophical articulations which, by distancing themselves from certain Cartesian and Occasionalist characteristics, attempt to link modern thought and method with classical philosophy and theology. The discourse about God, substance and freedom, based on the praedicatum inest subjecto, is justified by the perspective that the very essence of the substances is to express and represent the universe.
O presente texto tem como objetivo percorrer algumas obras e artigos do prof. Paul Gilbert para e... more O presente texto tem como objetivo percorrer algumas obras e artigos do prof. Paul Gilbert para explicitar o modo como ele afronta a sua sugestao sobre a atual tarefa da metafisica, a saber, a de desenvolver uma fenomenologia da relacao, embasada sobre o modelo da pessoa humana. Em primeiro lugar, discute-se sobre a distincao entre metafisica e ontologia. Em segundo lugar, a possivel instauracao de uma metafisica fenomenologica vinculada as coisas da vida. Por fim, a afetividade e assumida como mola propulsora da metafisica. O prof. Paul Gilbert se mostra um realista critico, um metafisico com bases fenomenologicas que se incumbe da tarefa intelectual de retornar aos fundamentos na busca de um prin- cipio primeiro, enquanto tal, inexaurivel. Palavras-chave: Metafisica fenomenologica; Ontologia; Afetividade; Doacao; Compaixao.

Expediente Da Revista "Sapere Aude" - Issn: 2177-6342
FILOSOFIA E SAUDE - V. 12, N. 23 (2021) - Jan./Jun. Em nosso presente momento, em que uma grande ... more FILOSOFIA E SAUDE - V. 12, N. 23 (2021) - Jan./Jun. Em nosso presente momento, em que uma grande pandemia assola o mundo, e preciso que estejamos atentos as contribuicoes que a Filosofia pode dar a area da saude, assim como as diversas areas da saude podem dar a Filosofia. E fato bastante conhecido que a Filosofia desde o seu inicio se debrucou sobre diversos temas, inclusive o tema da saude, a partir da propria compreensao da natureza. O ser humano como ser-lancado-no-mundo (para usarmos a expressao de Heidegger) sempre se colocou diante da natureza com uma atitude ambivalente. Por um lado uma atitude de temor, espanto, e por outro lado com uma atitude de admiracao e dependencia. Esse carater ambivalente da relacao do homem com o mundo vai desenvolver-se em reflexoes que ora destacarao o primeiro sentimento, ora destacarao o segundo sentimento.

OLIVEIRA, Ibraim Vitor de; RIBEIRO, Flávio A. Senra. Concepções filosóficas de mundo: Aristóteles, Tomás de Aquino e Nietzsche. In: OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro; SOUZA, José Carlos Aguiar de. Consciência planetária e religião. Desafios para o século XXI. São Paulo: Paulinas, 2009, p. 77-93.
Não é demasiado dizer que os visíveis problemas ambientais da atualidade decorrem, em larga escal... more Não é demasiado dizer que os visíveis problemas ambientais da atualidade decorrem, em larga escala, de uma arraigada e insistente concepção metafísica do mundo. Semelhante visão demarca, ainda hoje, a sua supremacia particularmente nos avanços tecnológicocientíficos da sociedade hiper-positivista em que vivemos. O homem já não consegue se relacionar com o meio ambiente sem projetar nele os seus próprios cálculos racionais. A "natureza" enquanto tal é impedida de se mostrar graças ao forte domínio do homem sobre a terra. Visto como utilizável, o meio ambiente foi submetido aos desígnios e caprichos humanos sem que o próprio homem tivesse clara dimensão das conseqüências de seus empreendimentos. Não se trata, a princípio, de decisão deliberada pelo domínio precipitado sobre a terra. Observa-se muito mais um hábito ocidental, que dura mais de dois mil anos, em fazer com que a natureza responda aos anseios humanos. Submeter a terra tornou-se um modus vivendi que, inconscientemente, se revela como completa superposição da razão sobre o que é tido como irracional. O que não é capaz de razão deve se submeter à calculabilidade racional para o bem do homem e para o exercício do saber-fazer. O homem progride quando é capaz de estabelecer seus critérios sobre a "natureza" irracional. Com isso, a razão, que tudo organiza, salvaria o mundo irracional de si mesmo. Pretende-se mostrar que tal hábito ocidental instaurou-se graças à concepção metafísica do mundo. Mas o que se entende por concepção metafísica do mundo, capaz de impetrar hábitos assim tão duradouros e inconscientes que, afinal de contas, se voltariam contra o próprio homem? Não se responde facilmente a essa pergunta. Falar de concepção metafísica do mundo, de modo preciso, significaria percorrer âmbitos da história da filosofia não facilmente caracterizáveis. Devemos nos contentar com um traço comum segundo o qual o programa metafísico designa o saber ocidental, desde suas origens, concernente ao conjunto das verdades sobre o ser em sua totalidade. O mundo, aqui indicando a "natureza", é um dos modos de concepção do ser em sua totalidade. De algum modo, a razão instrumental moderna, que submete a natureza a seus cálculos, tem suas raízes no modo metafísico de conceber o mundo. Pode-se dizer que tal conjunto de verdades concernentes à "natureza" resguarda pelo menos dois modelos fundamentais: o grego e o cristão. O primeiro pode ser caracterizado pela original visão aristotélica da physis (da natureza) como mobilidade, como vir-a-ser; o

OLIVEIRA, Ibraim Vitor de. Nietzsche entre a moral e religião da vida. DRAWIN, C. R. et al. (Orgs.). Destinos da religião na contemporaneidade: um diálogo com a psicanálise, a filosofia e as ciências da religião. Curitiba, PR: CRV, 2015, p. 163-173., 2015
Em "Além do bem e do mal" Nietzsche confere notoriedade à expressão: “não existem fenômenos morai... more Em "Além do bem e do mal" Nietzsche confere notoriedade à expressão: “não existem fenômenos morais, apenas interpretação moral dos fenômenos...”, sua Hauptsatz, palavra lapidar de seu filosofar e de suas querelas religiosas. Poderíamos de modo superficial replicar: não existem fenômenos religiosos, apenas interpretação religiosa dos fenômenos. Significa dizer que a religião, em sentido geral, é apenas uma expressão da quase sempre inconsciente visão moral de mundo.
Poder-se-ia perguntar, será mesmo verdade que toda religião está sedimentada na moral sendo dela mera expressão? Não será possível identificar pelo menos dimensões religiosas do homem que não tenham como fundamento a moral de cálculos racionais? Em outros termos, é possível falar de transcendência no registro religioso sem o vínculo de estruturas moralizantes arquitetadas pelo homem?
Para enfrentar tais questionamentos, faz-se necessário, em primeiro lugar, averiguar o motivo pelo qual Nietzsche vê atreladas moral e religião. Em segundo lugar, explicitar até que ponto é possível considerar aspectos de religiosidade em Nietzsche para além do bem e do mal e em quais condições. Com semelhante procedimento, pretende-se reafirmar o conhecido exercício de proximidade entre a filosofia nietzschiana e a mística, que poderia justificar a perspectiva segundo a qual Zaratustra “é o mais devoto dos que não acreditam em Deus”.
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Papers by Ibraim V I T O R de Oliveira
Poder-se-ia perguntar, será mesmo verdade que toda religião está sedimentada na moral sendo dela mera expressão? Não será possível identificar pelo menos dimensões religiosas do homem que não tenham como fundamento a moral de cálculos racionais? Em outros termos, é possível falar de transcendência no registro religioso sem o vínculo de estruturas moralizantes arquitetadas pelo homem?
Para enfrentar tais questionamentos, faz-se necessário, em primeiro lugar, averiguar o motivo pelo qual Nietzsche vê atreladas moral e religião. Em segundo lugar, explicitar até que ponto é possível considerar aspectos de religiosidade em Nietzsche para além do bem e do mal e em quais condições. Com semelhante procedimento, pretende-se reafirmar o conhecido exercício de proximidade entre a filosofia nietzschiana e a mística, que poderia justificar a perspectiva segundo a qual Zaratustra “é o mais devoto dos que não acreditam em Deus”.
Poder-se-ia perguntar, será mesmo verdade que toda religião está sedimentada na moral sendo dela mera expressão? Não será possível identificar pelo menos dimensões religiosas do homem que não tenham como fundamento a moral de cálculos racionais? Em outros termos, é possível falar de transcendência no registro religioso sem o vínculo de estruturas moralizantes arquitetadas pelo homem?
Para enfrentar tais questionamentos, faz-se necessário, em primeiro lugar, averiguar o motivo pelo qual Nietzsche vê atreladas moral e religião. Em segundo lugar, explicitar até que ponto é possível considerar aspectos de religiosidade em Nietzsche para além do bem e do mal e em quais condições. Com semelhante procedimento, pretende-se reafirmar o conhecido exercício de proximidade entre a filosofia nietzschiana e a mística, que poderia justificar a perspectiva segundo a qual Zaratustra “é o mais devoto dos que não acreditam em Deus”.